Antes de subir ao palco no Best of Blues and Rock 2025, o Deep Purple – com exceção do vocalista Ian Gillan – concedeu uma entrevista coletiva à imprensa presente no local. Com mediação de Gastão Moreira, Roger Glover (baixo), Ian Paice (bateria), Simon McBride (guitarra) e Don Airey (teclado) responderam por cerca de 17 minutos aos jornalistas.
Em um gesto inesperado, Paice encerrou a conversa entregando o próprio microfone a uma das profissionais presentes na primeira fila, para que ela pudesse fazer uma pergunta. Veja os principais momentos abaixo:
Relação com a música brasileira
Trajado com óculos escuros, Don revelou que “Garota de Ipanema” é uma de suas canções favoritas de todos os tempos. Inclusive, tem uma curiosa história envolvendo o clássico:
“A primeira vez que vim ao Brasil com o Purple, estávamos no Rio e fui dar uma caminhada pela praia de Copacabana. Havia uma pequena cafeteria. Então, me sentei, pedi um café… e havia uma placa na parede que dizia: ‘Esta é a mesa onde Antônio Carlos Jobim escreveu ‘Garota de Ipanema’. Foi incrível. Simplesmente entrei e me sentei. Então estava no lugar onde a música nasceu. É uma das minhas músicas favoritas de todos os tempos”.
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Por sua vez, Roger não citou nenhum exemplo em específico, mas opinou que a música brasileira é diferente das demais:
“É algo totalmente único do seu país. Existe a música latina… e tem todo o resto, que é… outro universo. Basicamente, quando você liga o rádio, é isso que você ouve.
E quando você está aqui, é exatamente o que você quer ouvir. Você pode estar em qualquer lugar do mundo e, ao ligar uma estação de rádio, vai ouvir rock’n’roll, música country, jazz. Mas estando aqui, vai ouvir a sexy bossa nova e vai pensar: ‘sim… estou no Brasil’.”
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Por que o Deep Purple continua relevante, segundo a própria banda
Para Roger, o Purple não sabia exatamente o que estava fazendo quando começou. Mas, o baixista acredita que a música não tem barreiras, o que contribuiu para o crescimento do sucesso:
“Nós não sabíamos exatamente o que estávamos fazendo nos anos 70. Foi simplesmente o lugar certo, na hora certa. E a música é uma linguagem internacional. Isso nos abriu portas, tínhamos todo o mundo para tocar. Parece simples, na teoria… mas tente fazer: não é tão simples assim.”
Segundo Paice, não só o grupo, como outros nomes surgidos na década de 1970, continuam gerando identificação com a geração mais jovem devido ao aspecto humano inerente às faixas daquela época:
“Acho que o motivo pelo qual alguns daqueles discos incríveis e toda aquela música daquela época ainda conectam com os jovens de hoje é porque é algo humano. Às vezes não é perfeito… mas, justamente por isso, é perfeito.”
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Primeiro show em sete meses
Até então, o Purple não tocava ao vivo desde novembro do ano passado. Como relatado por Paice, os integrantes precisaram pegar um pouco mais “pesado” nos ensaios para a apresentação na capital paulista:
“Você pode praticar todos os dias em casa. Mas é totalmente diferente de estar no palco. É preciso energia. Então, reservamos dois dias, só para ajustar os tempos, lembrar o que está acontecendo e garantir que as mãos lembrem o que o cérebro manda fazer.”
Relançamento de “Rapture Of The Deep”
Em agosto, o grupo disponibilizará uma versão remasterizada e remixada do disco “Rapture Of The Deep” (2005). Sincero, Paice revelou que “não faz ideia” do motivo pelo qual ele e os colegas escolheram justamente o material para um relançamento:
“Não sei [risos da plateia]. Sabe, há tantas coisas que eu não sei sobre o que fazemos, e estou feliz com isso. Tendemos a fazer as coisas porque parece a coisa certa a fazer, mas tentar analisar por que algo aconteceu, por que fizemos ou deixamos de fazer… Não fazemos a menor ideia.”
A importância do rock
Aproveitando a ocasião, Roger explicou por que, ao seu ver, o rock impactou tanto a música mundial.
“Tenho que dizer… quando nasci – faz bastante tempo já – eu presenciei o nascimento do rock and roll. E aquilo foi algo realmente impressionante. Uma revolução no mundo com a chegada do rock and roll. E mudou tudo. Mudou completamente. Antes disso, a música era… muito monótona. Algumas eram até bonitas, mas… não tinham a emoção, a energia do rock and roll. E isso mudou a minha vida.”
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A escolha dos setlists
Com relação ao setlist, Roger revelou que a escolha é sempre complexa, já que os músicos não querem abrir mão dos clássicos, mas também precisam tocar as faixas mais recentes:
“Esse é um dos maiores debates que temos, porque sempre é bom incluir músicas novas no repertório. Mas a realidade é que, se não tocássemos algumas das músicas que as pessoas conhecem, nós simplesmente não estaríamos trabalhando. Então, é uma questão difícil. Não há uma resposta certa [se é melhor tocar as músicas novas ou antigas]”.
De acordo com Paice, é claro:
“Você não vai agradar todo mundo. Sempre vai ter alguém dizendo: ‘Vocês não tocaram a minha música favorita’.”
Por fim, Don até mesmo acrescentou:
“Fizemos uma turnê há alguns anos e recebemos uma reclamação do promotor. Ele disse: ‘vocês não estão tocando material novo o suficiente’. Respondemos: ‘Sério? Acho que estamos tocando três músicas novas’… então aumentamos para cinco. E, para minha surpresa, a recepção foi boa. As pessoas realmente querem ouvir as novidades. Elas querem ver que a banda está viva, não é um museu. É uma banda que ainda está ativa, ainda está criando. E é isso que tentamos fazer: misturar tudo.”
Entrada de Simon McBride
Quando perguntado a respeito da entrada do “novato” Simon McBride, guitarrista do Purple desde 2022 em substituição a Steve Morse, Don destacou que conheceu o músico quando ele tinha apenas 15 anos, numa espécie de feira. Posteriormente, os dois excursionaram juntos, o que culminou na entrada do integrante.
Mais quieto, Simon reservou sua participação na coletiva apenas para destacar as suas maiores influências no instrumento de seis cordas: “Eu cresci nos anos 90, então ouvia músicos como Joe Satriani e Steve Vai, os chamados shredders. Mas provavelmente o meu guitarrista favorito era Gary Moore.”
Admiração pelos Beatles
Ainda no mesmo tópico, Don colocou os Beatles como responsáveis por mudar a sua visão a respeito da música. Lembrando até mesmo a data em que ouviu o Fab Four pela primeira vez, o tecladista destacou:
“O dia [que tudo mudou], para mim, foi 11 de janeiro de 1963. Foi o dia em que os Beatles lançaram ‘Please Please Me’. Eu estava no ônibus escolar, voltando para casa. Ninguém desceu do ônibus. E eu pensei: ‘O que está acontecendo aqui?’; Aquela banda, os Beatles, tinham lançado um disco. Todo mundo estava indo direto para o centro da cidade para comprar o single. Ninguém desceu do ônibus escolar. Quando finalmente cheguei ao centro, era como assistir a uma cena lendária. As pessoas gritando, havia apenas uma loja de discos na cidade e já tinha começado um tumulto. As garotas estavam gritando, a polícia estava lá, o trânsito foi interrompido. Por um dia… a vida mudou. A Grã-Bretanha mudou.”